Visão do Correio

Negacionismo conduz riscos à saúde pública

Se a pandemia mostrou que as vacinas salvam vidas, a mudança desse cenário depende, principalmente, das famílias brasileiras

Esta vacina deixa uma cicatriz característica e eterna: uma bolinha no braço direito. Ela também protege contra a hanseníase, popularmente conhecida como lepra.  -  (crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Esta vacina deixa uma cicatriz característica e eterna: uma bolinha no braço direito. Ela também protege contra a hanseníase, popularmente conhecida como lepra. - (crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Criado pelo produtor de televisão canadense R. Scott Gemmill, a série The Pitt, exibida na Max, é uma das sensações do streaming em 2025. A produção se volta a um único dia em um hospital de pronto-socorro de Pittsburgh, na Pensilvânia. Dentro do equipamento de saúde, diversas nuances são problematizadas com foco nos desafios profissionais, humanos, morais e éticos enfrentados pelos trabalhadores da saúde. 

Em um dos episódios, a equipe coordenada pelo doutor Michael Robby se depara com uma família desesperada para descobrir a doença do filho. Após uma anamnese bastante desafiadora, o chamado diagnóstico por exclusão conclui que o pré-adolescente está com sarampo — doença controlada na maior parte dos países, inclusive no Brasil, graças à vacina tetraviral, que também protege contra a rubéola, a caxumba e a varicela. 

A reação da equipe de Robby em "The Pitt" é automática: questionar os pais sobre os motivos da não vacinação do filho e ressaltar que o imunizante existe e é aplicado sem custos, mesmo em um país com um sistema de saúde pública de alto custo, como os Estados Unidos. 

A partir dali, o que se vê no desenrolar do caso é uma mãe resistente ao tratamento médico por conta de informações falsas compartilhadas nas redes sociais. A resposta só é permitida com anuência do pai, que aproveita um momento de distração da progenitora para autorizar o combate à doença, que, só em 2025, infectou cerca de 1 mil pessoas nos EUA. 

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A negação à vacinação infantil é um problema mundial e com reflexos no Brasil, como mostrou o Anuário Vacina BR, dissecado pelo Estado de Minas em matéria publicada na semana passada. No caso de Minas Gerais, as coberturas vacinais vêm caindo desde 2015, com quedas acentuadas a partir da pandemia de covid-19. A dificuldade é ainda mais crescente quando se olha para a adesão aos esquemas completos, ou seja, as imunizações que precisam de doses de reforço.

A publicação é resultado do cruzamento de dados públicos sobre vacinação com registros populacionais e de nascidos vivos e cobre o período de 2000 a 2023. De acordo com o estudo, a tríplice viral, que protege contra o sarampo e outras viroses, só teve sua meta de cobertura de 95% alcançada em quatro estados para a primeira dose. No entanto, nenhum deles conseguiu ultrapassar 80% de cobertura para o esquema completo, e 14 unidades federativas ficaram abaixo de 50%. 

Os dados ligam o alerta para um problema social de profundos reflexos para a saúde pública brasileira. Se a pandemia mostrou que as vacinas salvam vidas, a mudança desse cenário depende, principalmente, das famílias brasileiras, ainda que o poder público tenha que cumprir seu papel com a oferta de imunizantes de maneira descentralizada e com a elaboração de campanhas de conscientização. São os pais os principais responsáveis por essa proteção das crianças.

O combate ao negacionismo é o maior desafio nesse panorama. É necessário monitoramento contínuo das informações fraudulentas que circulam nas redes sociais, a partir de um protocolo de resposta assertivo e ágil. Iniciativas como a oferta da imunização nas escolas são bem-vindas, mas é por meio da comunicação governamental que esse retrocesso precisa ser freado.

 


postado em 25/06/2025 06:00
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